Airbnb em imóveis HIS-2: quando a função social da moradia é colocada em risco.

Entenda por que a locação por Airbnb em imóveis HIS-2 pode ser ilegal e colocar em risco a função social da moradia.

Judson Ribeiro Assunção

5/3/20252 min read

Tenho acompanhado de perto uma tendência preocupante em São Paulo: imóveis que deveriam servir como moradia para famílias de baixa renda, especialmente os classificados como HIS-2, sendo usados como hospedagem por temporada no Airbnb. Em tese, pode parecer inofensivo. Mas, na prática, estamos diante de um desvio claro da finalidade pública desses empreendimentos — e isso tem consequências.

Esses imóveis não são como qualquer outro. Eles fazem parte de programas habitacionais que contam com incentivos públicos: menos exigências urbanísticas, isenções de outorga onerosa, aprovação facilitada e, principalmente, localização estratégica em regiões centrais. Isso tudo é viabilizado com uma contrapartida: garantir o direito à moradia para quem mais precisa.

O problema começa quando essas unidades passam a ser tratadas como investimento. A pessoa compra o imóvel, muitas vezes sem saber das restrições — ou sabendo, mas ignorando —, e começa a alugá-lo por dia, via plataformas digitais. A lógica da moradia dá lugar à lógica da renda passiva. E aí não estamos mais falando apenas de uma escolha pessoal: isso impacta o condomínio, os vizinhos e o próprio programa habitacional.

Em assembleias e atendimentos jurídicos que faço, tenho visto síndicos e moradores incomodados com o entra e sai de estranhos, perda de segurança e descaracterização do ambiente residencial. Alguns condomínios, inclusive, já aprovaram regras para restringir ou proibir esse tipo de locação — e com razão.

A Justiça, embora ainda não tenha julgado um caso específico envolvendo Airbnb em imóvel HIS-2, já tem se posicionado firmemente sobre locações de curta duração em condomínios residenciais. Em 2021, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que, quando a convenção prevê uso exclusivamente residencial, é possível proibir esse tipo de locação. Segundo os ministros, a prática se assemelha mais à hospedagem comercial do que à locação por temporada tradicional — e pode ser barrada.

Do outro lado, o Ministério Público de São Paulo também começou a agir. Em janeiro de 2025, foi ajuizada uma ação civil pública contra o Município de São Paulo, exigindo que a Prefeitura fiscalize melhor a destinação dos imóveis HIS e HMP. A promotoria apontou falhas na checagem da renda dos compradores e no uso final das unidades. O pedido foi direto: suspender novas autorizações até que haja controle real e efetivo sobre quem está comprando e como está usando esses imóveis.

Ou seja: o cerco está se fechando. Quem insiste em usar essas unidades para fins comerciais corre riscos. Já há discussões sobre revisão da classificação do imóvel, cobrança retroativa de impostos, multas e até ações judiciais por perturbação ou prejuízo à coletividade condominial.

Agora, vamos combinar: ninguém é contra quem quer ganhar um dinheiro extra. Mas quando esse ganho compromete o que deveria ser um direito básico — a moradia —, a linha da legalidade e da ética começa a ser ultrapassada.

Como advogado, oriento sempre: se você comprou um imóvel HIS-2, entenda o que isso significa. Verifique os documentos, consulte a matrícula, veja se há cláusulas restritivas. E se pretende alugar por plataformas digitais, pense duas vezes. O barato pode sair caro — judicial e financeiramente.

Esse tipo de discussão não é só sobre leis, mas sobre justiça social e respeito à coletividade. A moradia não pode virar produto especulativo às custas de um programa público que existe justamente para equilibrar desigualdades.

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